Abuso sexual de meninos e os riscos à saúde mental
08 de Fevereiro de 2024
O abuso sexual infantil é um dos crimes mais subnotificados do mundo, e a situação é ainda mais obscura quando se trata de meninos, pois, embora dados estatísticos nacionais e internacionais indiquem um número expressivo de vítimas, ainda há poucos estudos envolvendo a temática.
A grande lacuna se adensa pela dificuldade de acesso, seja no momento próximo à vitimização, seja em momento posterior, o que denuncia uma situação de grave negligência, silenciamento, existência de tabu e estigma social.
É necessário, portanto, conhecer melhor a realidade do abuso sexual de meninos, sua epidemiologia, suas características, bem como suas consequências. Nesse contexto, mais pesquisas e mais diálogos intersetoriais precisam ser feitos a fim de permitir a visibilidade desse tipo de violência.
Fatores de risco
As pesquisas até agora feitas com o público infantil masculino indicam como possíveis fatores de risco: viver apenas com a mãe ou com nenhum dos pais; ter pais que se casaram novamente ou são separados; ter pais dependentes de álcool ou que apresentam comportamentos criminosos; ser negro e pertencer a classes sociais mais baixas.
Enquanto meninos menores de 6 anos estão mais expostos à violência sexual intrafamiliar, os de 12 anos ou mais têm risco maior de sofrer violência sexual extrafamiliar. Por sua vez, os ofensores são 82% do sexo masculino e 17% do sexo feminino, geralmente pessoas próximas.
Silenciamento
Normalmente, vítimas de abuso sexual são pouco hábeis para falar sobre o assunto e somente um terço dos meninos abusados fala espontaneamente sobre a violência sofrida.
Entre as razões do silenciamento relatadas por meninos entre 7 e 13 anos, estão o medo da reação dos pais e de outras pessoas, receio de uma possível ruptura familiar, medo da reação do agressor, vontade de esquecer o fato.
Consequências
A literatura aponta que inúmeras e complexas variáveis devem ser consideradas quando se fala sobre as consequências da violência sexual na vida de crianças e adolescentes, que tanto podem sofrer com efeitos mínimos ou com nenhum efeito aparente quanto podem desenvolver graves problemas sociais e/ou psiquiátricos.
Entre os possíveis efeitos problemáticos, estão comportamento sexualizado inapropriado, ansiedade, depressão, estresse pós-traumático, distúrbios alimentares, abuso de substâncias, baixa autoestima, isolamento, agressividade, problemas escolares, comportamento autolesivo, ideação suicida e tentativa de suicídio.
Diferenças
Enquanto as meninas vítimas de abuso sexual apresentam predominantemente sintomas de estresse pós-traumático, depressão e erotização, os meninos apresentam retraimento em relação à figura masculina e isolamento.
O rendimento escolar fica mais comprometido entre as meninas. No entanto, meninos e meninas apresentam agressividade, além de outras reações psicológicos, tais como culpa, medo, vergonha, insegurança, raiva, passividade, ambivalência e sentimentos de inferioridade.
A violência sexual também pode fazer os meninos se sentirem confusos quanto à sua sexualidade e temerosos quanto à sua possível homossexualidade.
Ainda: meninos e homens podem desenvolver estereótipos comportamentais e atitudes agressivas para afirmar ou reafirmar sua masculinidade: comportamentos destrutivos, desobediência, confronto e hostilidade.
Livro
O abuso sexual de meninos é um dos assuntos tratados no livro ‘Violência: compêndio teórico-prático sobre vítimas e agressores’, publicado pela Sinopsys Editora.
Organizada pela psicóloga Cristiane Flôres Bortoncello, a obra se debruça sobre a violência em diversos contextos e abordagens psicoterapêuticas e jurídicas. Com 704 páginas, reúne quase 80 autores, entre psicólogos, psiquiatras, advogados, promotores, juízes, desembargadores e pesquisadores.
Trata-se de um livro completo que auxilia os estudos de todos os profissionais interessados em compreender mais sobre a temática, oferecendo suporte teórico para a prática clínica e jurídica.