Epistemologia das ciências cognitivas
23 de Dezembro de 2022
As chamadas ciências cognitivas (CC) são um conjunto de disciplinas formado pela psicologia cognitiva, inteligência artificial, filosofia da mente, neurociência e suas relações interdisciplinares, que se dedicam a investigar a cognição humana.
Portanto, seu objeto de estudo não é diretamente observável, precisando ser inferido de comportamentos.
É possível definir cognição como representações mentais e suas regras de transformação. As ciências cognitivas investigam os processos envolvidos na aquisição, representação, armazenamento e utilização do conhecimento, como sensação, percepção, atenção, memória, aprendizagem, pensamento e linguagem.
INOVAÇÕES CONCEITUAIS
As teses epistemológicas nas quais estão baseadas as CC ofereceram inovações conceituais e teóricas que constituíram avanços evidentes para o desafio da abordagem científica da mente humana.
Superam vários vetos e obstáculos colocados pela tradição filosófica e científica à constituição da psicologia como ciência moderna, mas ainda não resolveram todos os problemas ontológicos, epistemológicos e metodológicos que desafiam a constituição de uma ciência da mente.
O problema da explicação do comportamento individual é certamente um deles, assim como sua contraparte, o problema das leis psicológicas, mascarado com as teses mecanísticas.
O saldo geral, no entanto, são a enorme ampliação das fronteiras da psicologia e a reumanização de seu objeto, realizadas ao tornar possível a investigação científica de legítimos fenômenos psíquicos.
INCOMPATIBILIDADE
Os pressupostos metafísicos materialistas da maioria de seus praticantes também geram consequências sérias e ineludíveis, como a incompatibilidade com um genuíno livre-arbítrio e o consequente conflito com as mais básicas pressuposições morais e jurídicas.
Talvez a mais definitiva das limitações dessa tese é a sua incapacidade para lidar com as questões mais importantes da consciência, o mais básico fenômeno da vida psíquica.
Trabalhos largamente reconhecidos filosoficamente já ofereceram poderosos argumentos sobre a incompatibilidade dos fenômenos de qualia (as experiências qualitativas de primeira pessoa que ocorrem quando se pensa ou se sente) com o fisicalismo e a impenetrabilidade do problema central da consciência pelas ciências cognitivas.
Talvez o grande desafio epistemológico que as CC tenham pela frente seja não mais o alargamento de suas fronteiras, mas o reconhecimento delas. Afinal de contas, todo conhecimento humano é limitado.
LIVRO
O livro “Psicologia cognitiva: teoria, modelos e aplicações”, organizado pelos psicólogos Gustavo Gauer e Luciana Karine de Souza e publicado pela Sinopsys Editora, oferece conteúdo produzido por autores brasileiros representativos da consolidação da área no país, como professores e pesquisadores atuantes.
Os temas são tratados de uma maneira voltada às expectativas da realidade nacional no ensino de processos psicológicos básicos (PPBs) na graduação e pós-graduação.
A obra apresenta questões cruciais sobre teoria e epistemologia da ciência cognitiva, modelos fundamentais de PPBs, incluindo diferentes sistemas de memória, resolução de problemas e tomada de decisão, assim como relações com outros campos psicológicos, de domínios correlatos, como desenvolvimento, personalidade e terapias cognitivo-comportamentais.